1. Introdução
A produção da escrita no contexto escolar sempre induz o professor a instigar os alunos a desenvolver esta habilidade. Trata-se de uma habilidade em que a imaginação tem fundamental influência, seja na composição do texto, seja na motivação ao que será escrito. No intuito de fundamentar este trabalho, busco a contribuição de Ciríaco (2020), no texto: A Leitura e a Escrita no Processo de Alfabetização.
Sabe-se que ter imaginação é algo muito importante na vida da criança, pois é com essa faculdade que a consciência infantil elabora aquilo que vai captando de forma intuitiva no mundo que a cerca. As descobertas do mundo surgem para a criança como fantasia, como algo extraordinário, embora não se possa dizer que ela confunda os elementos do real com o do mundo irreal (Ciríaco, 2020).
Nos diferentes contextos da Educação vemos alunos que criam uma barreira no momento da produção textual, um cenário comum a quase todos os ambientes escolares. Não foi diferente o que encontrei quando ingressei na SME da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro – RJ, lotado no Ciep Hélio Smidt – Bairro da Maré. Com aspectos similares a outros ambientes estudantis, os alunos que encontrei e convivi mostraram peculiaridades que desde o início muito me motivou\despertou para o potencial existente nas diversas comunidades ali instaladas. Ao mesmo tempo que se visualiza a carência, em muitos casos, a falta de credibilidade na potencialidade daqueles que ali residem e, que buscam no espaço escolar um complemento de suas necessidades diárias, seja o espaço físico da escola; seja na convivência com os demais, nem sempre amistosas; ou até mesmo na busca pelo complemento alimentar. Muitos desses fatores acabam por influenciar um descrédito na capacidade deles, naturalizando uma completa discriminação, construindo o espectro da impotência intelectual, perpetuando uma chaga muitas vezes desenvolvida e mantida por quem deveria combater e desconstruir.
Neste cenário, vemos todos os dias os acontecimentos, simplesmente, se repetindo, numa total naturalização do que mais incomoda a qualquer educador, ou pelo menos deveria incomodar, a acomodação, a falta de perspectiva, a violência em todos os níveis (dentro e fora do ambiente escolar), a desistência para aprender (não confundir com abandono escolar), por fim, a aprovação sem o aprendizado. Todos esses aspectos têm uma gigantesca influência no meu fazer pedagógico, não com poder paralisante, e sim, com um poder criativo para germinar e florescer a semente da produção textual, neste norte tenho procurado seguir.
Desde que ali cheguei, no Ciep Hélio Smidt, procurei sempre desenvolver algo que os despertassem, que os fizessem sentir capazes de seguir a trajetória escolar com naturalidade, de forma que fossem vistos com exemplos de que é possível sim. Nos primeiros anos aprendi muito com as primeiras turmas, a cada ano os resultados foram sempre muito bons. Temos perdas sim, infelizmente, mas os resultados positivos são muito significativos.
2. Alguns relatos
Procurando estabelecer uma relação da imaginação com a produção textual, seja na composição da frase, seja nos mais diversos textos desenvolvidos em classe. Por mais que o cenário que os cerca seja repleto de fatores e acontecimentos que os envolvem, eles precisam de uma conexão para usufruir da imaginação deste cenário e a transferência para a escrita. Nesta experiência diária nota-se tanta imaginação sem utilização para a escrita. É notório que muitos alunos, por não terem ainda aprendido a utilizar a imaginação na produção textual, escrevem frases com muita repetição de palavras, exemplo: “Mamãe é bonita.”; “Papai é bonito.”; “A bola é bonita.”; o que muitos atribuem falta de vocabulário, eu atribuo falta de utilizar a imaginação.
Aos poucos fui desenvolvendo estratégias que me ajudaram muito, exemplo: Certa vez ao escrever no quadro “janela”, perguntei por diversas vezes aos alunos, o que eles estavam vendo, tendo como resposta: – janela, janela, janela. Ao que chamei atenção deles que isso estava acontecendo na hora da escrita deles e que eles deveriam usar, naquele momento, a imaginação. Voltei a perguntar o que eles estavam vendo, tendo como resposta “as letras”, e leram as letras. Ao que voltei a chamar a atenção deles, de como deveriam usar a imaginação naquele momento, e então, desenhei uma janela no quadro, foi mágico, eles viram tantas coisas na janela desenhada, viram até o que não estava no desenho. Esta aula me rendeu uma mudança significativa na produção de frases e textos da turma.
Nesse período, vivi uma experiência também muito importante. Certo dia, durante o recreio, duas alunas (as duas menores da turma), muito amigas, uma fala demasiadamente a outra extremamente calada, me abordaram no pátio e tentaram me relatar uma história que elas viveram ou imaginaram que acontecera no pátio do Ciep. Ouvi por cerca de três vezes, cada uma das vezes a história sofria modificação. Não hesitei, propus a elas que colocassem aquela maravilhosa história no papel, e que, assim fizessem, eu iria editar um livro com a história delas. Por elas serem as menores, pouco falavam com a turma, a turma achou uma ‘afronta’ elas terem escrito e o texto delas tornar-se livro. Naquele ano foi um festival de textos e alguns livros editados e produzidos na turma.
A motivação é, portanto, o processo que mobiliza o organismo para a ação, a partir de uma relação estabelecida entre o ambiente, a necessidade e o objeto de satisfação. Isso significa que na base da motivação está sempre um organismo que apresenta uma necessidade, um desejo, uma intenção, um interesse, uma vontade ou uma predisposição para agir (Ciríaco, 2020).
Em 2020, ao contrário das experiências dos anos anteriores, assumi uma turma de quinto ano, uma turma que a maioria havia passado por mim quando estavam no terceiro ano e que estariam concluindo o Ensino Fundamental I. Busquei montar estratégias que os motivassem na produção textual, algo diferente e motivador, que fosse do interesse deles e que ao mesmo tempo proporcionasse um sentido mais positivo ao audiovisual e as redes sociais que eles tanto frequentam. Busquei montar um projeto, com objetivos, desenvolvimento, execução e tudo que fosse necessário à viabilidade, que realmente os envolvessem e, sem muitas cobranças; algo que fosse visto como natural. Apresentei o projeto à turma que inicialmente gostaram muito, mas só acreditaram quando viram acontecer. O melhor é que eles teriam assuntos do interesse deles para escrever, usariam ferramentas digitais.
3. O projeto
Numa perspectiva pretensiosa, mas sem a certeza do envolvimento da turma, surge o projeto: Jornal do Ciep Hélio Smidt. Um jornal voltado a relatar acontecimentos relevantes que surgiram dentro do Ciep; assuntos como: a arrumação da escola para o retorno às aulas; o carnaval do Ciep; os eventos e projetos desenvolvidos pelas outras turmas; as festas em geral. Desses eventos, os grupos formados na turma iriam produzir textos descrevendo o acontecimento e as entrevistas feitas por eles, gerando vários textos e reescritas dos textos, pois somente um texto estaria na programação do jornal. Um jornal produzido totalmente em sala de aula. Após improvisarmos um espaço de gravações, seguimos o roteiro: reportagem do evento (fotos e entrevistas); produção textual (escrita, reescrita, seleção da melhor produção); começamos a identificar os apresentadores; bancada de apresentação; celular à mão; edição e apresentação para os grupos de Whatsapp dos pais e da escola. Já durante os trabalhos iniciais, a motivação dos grupos foi algo comovente; o interesse deles em produzir, sem nem terem feito as gravações. Depois que o primeiro trabalho foi exposto, o interesse foi tanto que eles começaram a sugerir outras reportagens.
Durante o desenvolvimento do projeto, paralelo à produção textual, naturalmente fomos introduzindo uma leitura diversificada, voltada a conhecer diversos tipos de textos jornalísticos. Nesse momento o jornal Maré, feito na comunidade, tem um papel fundamental. Ele disponibiliza vários exemplares de suas publicações para o Ciep, colaborando em muitos trabalhos realizados com os alunos. Essa leitura torna-se algo de interesse comum aos que estão tomando parte no projeto. Com igual importância sugeri o acompanhamento dos telejornais das emissoras de tv, bem como realizamos debates sobre o que achavam de interessante nas produções da tv e o que poderia nos servir para aperfeiçoarmos nosso trabalho.
A leitura e a escrita são práticas que se relacionam e complementam a formação de um leitor competente, o objetivo maior da escola, pois a leitura e a escrita são os maiores instrumentos para a construção do conhecimento. Despertar no aluno o interesse pela leitura é o maior legado de uma prática constante da leitura de textos variados (Ciríaco, 2020).
4. Conclusão
Cabe ressaltar a contribuição do audiovisual como ferramenta de grande relevância em todos os eventos que realizamos na educação. Ainda nos limitamos muito nesse processo de introdução do audiovisual no contexto de sala de aula, seja pela simples falta do equipamento, seja pela falta de total domínio de suas possibilidades. Porém, pode-se afirmar que todos ganhamos, aprendemos e, fica um sentimento que aguça nossa busca em investir cada vez mais nos processos que envolvam o audiovisual nos ambientes de ensino.
O aprendiz, nesse contexto, é um sujeito protagonista do seu próprio processo de aprendizagem; alguém que é capaz de transformar informações em conhecimento próprio; que age sobre o objeto de conhecimento, pensa sobre ele, significando-o; e que interage com outras pessoas e com o meio (Ciríaco, 2020).
É nesta perspectiva que seguimos, como aprendizes, buscando cada vez mais a interferência do audiovisual, despertando, somando e contribuindo. Ao mesmo tempo, ajudando a desconstruir uma barreira que o ser humano insiste em perpetuar na trajetória dos menos favorecidos.
5. Referências bibliográficas
CIRÍACO, Flávia Lima. A leitura e a escrita no processo de alfabetização. Educação Pública, v.20, nº 4, 28 de janeiro de 2020. Disponível em: https://educaçãopublica.cecierj.edu.br/artigos/20/4/a-leitura-e-a-escrita-no-processo-de-alfabetização.